confiar nas marcas? porquê?

a evolução dos programas de fidelização, o crescimento do e-commerce e das compras online e o marketing digital (em geral) são algumas das grandes influências que mudaram a forma de interação do consumidor com as marcas

em consequência, as marcas têm agora à sua disposição grandes quantidades de dados, e estão a ser feitos esforços pela parte destas no sentido de fazer um uso maior (e melhor) dos mesmos, em benefício dos consumidores, delas próprias e dos seus parceiros

mas à medida que esta tendência se acelera, e que os consumidores se tornam mais exigentes em termos da utilização dos seus dados, começam a surgir questões importantes, tais como o que os clientes sentem sobre a utilização dos seus dados e para que tipos de serviços os consumidores estariam dispostos a partilhar os seus dados

é este o tema do relatório "The consumer data give and take", da Deloitte Global em parceria com a Ahold Delhaize, que detalha os resultados de um inquérito online realizado em 15 países e a 15.000 inquiridos sobre as atitudes em relação à utilização e partilha de dados dos consumidores (podem consultar o report aqui)

existem alguns dados que me parecem particularmente importantes, principalmente os que dizem respeito à confiança e à vontade em partilhar informação, nomeadamente nesta época de digitalização (à bruta e sem anestesia...)

ou seja, as pessoas (ainda) não confiam, ponto. E por isso não estão disponíveis para partilhar a sua informação (apesar de o fazerem muitas vezes "sem saberem"). Não preciso por isso de ler mais nada para perceber o que é que precisamos mudar com urgência. Falamos de digitalização, de propósito, de relevância... mas continuamos com um problema grave de (falta de) confiança... 
 
e a situação não é particularmente melhor para ninguém, sendo que aqueles que mais recolhem dados são aqueles em quem menos as pessoas confiam... porque será?

acho particularmente importante estimular a discussão em torno da necessidade de recolha de dados e da ética da utilização dos dados, das responsabilidades das marcas e das suas respostas à regulamentação da recolha e partilha dos dados pessoais, de acordo com as expectativas dos consumidores. Esta discussão será fundamental para a formação tanto da regulamentação como das expectativas dos consumidores

aí sim, poderemos dar um passo importante e falar de valores, de propósito e de relevância. 

a confiança "é a base da evolução de qualquer comunidade, tanto na sua vertente económica como na social ou cultural (...)  a variável com maior impacto na evolução económica das sociedades é a confiança - sem esta, o investimento nunca será suficiente, o consumo será sempre incerto e os níveis de poupança basear-se-ão mais na incerteza sobre o futuro do que na segurança

as palavras são do Prof. Carlos Brito, que tenho todo o gosto em citar porque sabe bem do que fala; por isso sugiro - para continuação desta nossa conversa - a leitura do artigo a "Economia da Confiança", para a Dinheiro Vivo, excelentemente bem escrito

confiar nas marcas? porquê? é a pergunta que eu peço a todos os que trabalham com marcas não deixem - nunca - de fazer

'the obsession with progress is what this place is about'

estou neste momento a ler o livro "The art of branded entertainment", um livro surpreendente por mil e uma razões, mas principalmente porque traz  luz ao fundo do túnel (bem escuro) em que as marcas e a publicidade se encontram, e nos ilumina um caminho a seguir - bem interessante

uma das iniciativas recorrentes ao longo do livro é a ação "The Farm" pela marca Adidas (já de 2017...). Em Greenpoint, Brooklyn, num armazém muito pouco pretensioso, mesmo em frente a um fornecedor de pedra, a Adidas tenta construir o (seu, o nosso) futuro

foi aqui que a empresa construiu a sua "Creator Farm", um local muito pouco secreto onde a Adidas acolhe equipas de "designers" de estúdios de todo o mundo


 


"the creator farm" não é o estúdio de design típico, e mantém esse nome porque a marca queria que o espaço fosse "earthy and real" e um lugar "where you can get your hands dirty"; nas palavras do director criativo:

"it's meant to be a little provocative, It's where we cultivate talent. [...] "It's more about exploration, the obsession with progress is what this place is about — not the obsession with results."

"people don't buy sports products ... just because they need a new pair of shoes, they want a new pair of shoes. You need to be able to blend those cultural insights and desires with the purpose of the product, the functional needs. That's the kind of thing we explore here."

(só uma curiosidade para os "nerds" do "branded content": o vídeo da marca tem 19.480 visualizações, o da Karlie Kloss tem 201.119, e a diferença de datas de publicação por si só nao chega para justificar a diferença de impacto)

para o que nos interessa - "the creator farm" - é uma parte importante da estratégia da Adidas para se aproximar e se manter em sintonia com as necessidades e vontades dos consumidores (actuais e futuros). E para isso criou o espaço que o permite, não ficou à espera de acontecer! Brilhante. 

só na industria do gamimg é que tenho assistido a iniciativas como esta, de envolvimento com as pessoas (consumidores ou outros profissionais) no desenvolvimento de produto, na inovação e na construção da própria (cultura da) marca - isto sim é construir de marca, é procurar relevância, propósito

ou, nas palavras dos próprios à pergunta "qual é a principal função do espaço?" — "criar cultura", respondeu Marc Dolce, VP e director criativo da Adidas! gosto